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Thiago Boa Sorte revela como se descobriu uma pessoa de gênero fluido

O doutorando em gerontologia Thiago Boa Sorte revela um pouco de sua trajetória e desafios ao se descobrir como gênero fluido

Imagem de Thiago Boa Sorte
Thiago Boa Sorte (Foto: Divulgação)

Apesar de todos os avanços em relação aos direitos LGBTQPIA+ e em como a sociedade, a cada dia, tem aprendido a ser mais inclusiva em relação à diversidade sexual, declarar-se de gênero fluido ou pessoa não binária ainda desperta polêmica e muitas dúvidas na Internet.

E era assim que o pesquisador e doutorando em gerontologia Thiago Boa Sorte se encontrava: rodeado de questões quanto à sua sexualidade e o seu lugar na sociedade. Hoje, Thiago se identifica como uma pessoa de gênero fluído e conta ao Observatório G como foi a sua jornada de autoconhecimento, aceitação e posteriormente militância pelos direitos e orgulho LGBT.

O que é o género fluido?

A primeira coisa que se faz necessário entender é que gênero não é o que aprendemos na aula de biologia. Essa é uma visão reducionista de uma questão tão ampla, visto que gênero é multifatorial, não depende somente do sexo biológico. Além dessa caraterística, há outros fatores como cromossomos, hormônios, cultura, anatomia, socialização, psicologia, entre outros. Portanto, uma pessoa pode ter nascido com a genitália atribuída á determinado sexo, mas se identificar com o oposto, com ambos, ou até mesmo nenhum. 

Outro ponto importante é que identidade de gênero e orientação sexual são completamente diferentes. O primeiro termo se refere à experiência de cada pessoa como indivíduo, como ela se identifica e se expressa em relação ao seu gênero, podendo ou não ser o qual lhe foi atribuído através de sua genitália de nascimento. Já a orientação sexual, fala sobre atração afetiva ou sexual que o indivíduo sente por pessoas do mesmo gênero, do oposto, de ambos ou nenhum. 

O Início

Thiago revela que, até alcançar o autoconhecimento, foram 29 anos procurando se encontrar e se adequar. “Por exemplo, eu na infância era super delicado, na adolescência tive impulsos a ser mais masculino, namorei meninas queria ser realmente mais “homem”, e hoje me vejo fluido e nunca me senti tão feliz na minha vida. Passei a vida toda vivendo como um homem ou pelo menos tentando, tentando ao máximo ser o que a nossa sociedade espera de um homem machão. Até que nada passou a fazer sentido. Ou tudo, de repente. E assim eu percebi que esta caixinha, a de ser homem apenas porque nasci com um pênis, não me cabia. O que aconteceu comigo não foi só uma quebra de paradigmas, tampouco apenas uma mudança nas roupas ou no visual como uma maneira de me rebelar contra o patriarcado. Me descobri uma pessoa trans não-binária, isto é: uma pessoa cuja divisão binária de gênero em homem x mulher não a contempla.”  

Desafios

Thiago também revela que este caminho lhe reservou também muitos desafios. “Não foi e não tem sido fácil. Eu perdi praticamente todos os meus referenciais e me senti perdido. Não sabia muito bem como lidar com essas questões, com o adendo de ser neuroatípico, desde criança ouvia meus familiares falando que eu era muito ‘afeminadinho’, e sempre oscilava em querer brincar ou com as meninas de elástico e no outro dia voltar imundo da rua com os meninos, atitudes como se apaixonar pela menina mais linda do bairro, mas olhava diferente pro irmão mais velho dela também, e com o passar dos anos eu não sabia mais qual espaço ocupar, eu amava ter o corpo magro, rosto fino e feminino pelas maçãs do rosto ressaltadas no tempo do ballet, mas também adorava os elogios do meu corpo que ganhou forma muscular na época que estava a treinar pesado já com o pensamento de me tornar um bodybuilder (o extremo másculo que alguém pode querer).”

Entre as dificuldades encontradas ao se assumir, vieram o preconceito e o abandono. “Muita gente que dizia me amar acabou me abandonando. E me vi terrivelmente só em muitos momentos. Quando você se assume e se entende gay e agora trans grande parte das pessoas cis, automaticamente, presume que a sua identidade de gênero será a “oposta” (como eu odeio essa palavra neste contexto) da que lhe atribuíram compulsoriamente ao nascer, tendo como parâmetro o seu sexo biológico. Por que, né? Que sentido faz você se reivindicar outra coisa que não seja uma mulher, já que não é um homem?”.

A jornada

Thiago Boa Sorte revela que, apesar de hoje saber quem é, ainda está em processo de descoberta. “E arrisco dizer que transicionar é um processo contínuo, infinito. Eu estou aprendendo a me amar e tomando decisões sobre como alcançar o corpo que gostaria de ter. Penso quase todos os dias se devo ou não fazer terapia hormonal e em quais implicações isso teria na minha saúde física e psicológica. E, para quaisquer que sejam essas decisões, precisarei ter dinheiro e muita paciência”, conclui.

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