Direito a Deus

Os sodomitas podem ser considerados os maiores pecadores? 

Caso o pecado de Sodoma fosse simplesmente o sexo homogenital em si, é coerente com a pregação de Jesus dizer que os sodomitas praticaram o Pecado dos pecados?

Cristo - Foto: Arte Canva
Cristo - Foto: Arte Canva

Esse título me faz lembrar da minha infância. Esse é um discurso que eu ouvi muito: “ser gay ou lésbica é o pior pecado de todos”, “o pecado mais abominável para Deus”.

Essa fala apresenta coerência com o que Jesus ensinou?

Vamos lá. Quem prega que a homossexualidade é o pecado mor o faz baseado na crença de que os sodomitas eram homossexuais. Desse modo, considerando que as Escrituras dizem que eles eram maus e grandes pecadores e que Deus destruiu toda a cidade, o que seria considerada a maior penalidade, construiu-se a ideia de que os gays e lésbicas praticam o pior dos pecados.

Essa semana eu ouvi algo bastante coerente: “que Deus injusto é esse que destruiu toda uma cidade, onde havia mulheres, crianças e animais inocentes, por causa do pecado dos homens?”

De fato, estaríamos diante de um Deus injusto, caso o pecado dos homens sodomitas recaísse sobre todos.

Porém, não é bem isso que a História e a Bíblia nos relatam. O ponto crucial do pecado dos homens de Sodoma, conforme já esclareci em outros artigos, não era o sexo propriamente dito. A questão era o objetivo que se almejava por meio do sexo. Os homens daquela cidade possuíam o hábito de afligir o estrangeiro, humilhando-o, subjugando-o, independente de quem fosse.

Um dos atos praticados era o sexo anal, como forma de domínio, superioridade e humilhação. Aqueles indivíduos não eram homossexuais e nem bissexuais. Eles possuíam uma prática que violava a Lei da Hospitalidade, tão importante naquele tempo. Inclusive Deus manda Moisés registrar a importância desta lei ao determinar: “ao estrangeiro não afligirás, nem o oprimirás, pois fostes estrangeiro na terra do Egito”.

Além disso, Ezequiel diz que os sodomitas praticaram abominações, palavra cuja origem hebraica é “toevah” e significa: abominações de ordem ritualística, especialmente idolatria.

Logo, os moradores de Sodoma eram maus e grandes pecadores porque violavam a Lei da Hospitalidade e praticavam a idolatria. Nisso pecavam todos os moradores, o que justifica a destruição total da cidade.

Os gays e lésbicas que vivem conforme sua orientação sexual não possuem vínculo com os sodomitas por duas razões: 1) não praticamos sexo como meio para idolatria ou abuso sexual. Nós vivemos relações consensuais; 2) muitos de nós suplicaram a Deus pela tal “cura gay” e não fomos atendidos. Oramos por amor ao Reino de Deus. Amamos Cristo e desejamos a salvação que há Nele. Desse modo, não nos encaixamos na descrição de “homens maus e grandes pecadores”, pois esse não é o nosso caráter perante Cristo, que conhece os nossos corações.

Pois bem. A despeito de a homossexualidade nada ter a ver com o pecado dos homens de Sodoma, os quais tinham a intenção de cometer um estupro coletivo, passemos a análise do discurso de que o pecado dos moradores daquela cidade constituiria o maior pecado de todos.

Ora, a primeira falácia se encontra no fato de que a Bíblia não descreve pecado, pecadinho e pecadão, salvo aquele que blasfema contra o Espírito Santo, conforme o próprio Jesus disse na passagem descrita por Mateus 12:31 – “portanto, eu vos digo: todo pecado e blasfêmia se perdoará aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito não será perdoada aos homens”.

E o que Cristo falou sobre a possibilidade de o pecado de Sodoma ser o Pecado dos pecados?

Vamos lá. Em duas passagens Jesus desfaz esse discurso. A primeira é descrita por Mateus 10:14-15, quando Cristo envia os discípulos à missão de pregar o Reino de Deus e os adverte dizendo:

14.E, se ninguém vos receber, nem escutar as vossas palavras, saindo daquela casa ou cidade, sacudi o pó dos vossos pés.

15.Em verdade vos digo que, no Dia do Juízo, haverá menos rigor para o país de Sodoma e Gomorra do que para aquela cidade”.

Há dois ensinamentos nesse trecho: 1) o primeiro é que há pecado maior do que o dos sodomitas; 2) se os sodomitas pecaram no passado pela falta de hospitalidade, maior pecado seria os das cidades que não recebessem os discípulos, pois a rejeição deles seria a rejeição da Nova Aliança em Cristo Jesus.

Esse entendimento apresenta consonância com o que a Carta de Judas diz no versículo 12 acerca dos homens que estavam se infiltrando no meio dos cristãos para trazerem uma doutrina, negando Cristo. O Apóstolo diz que eles são como “árvores murchas, infrutíferas, duas vezes mortas”.

É semelhante ao que a Carta aos Hebreus diz, quando atesta ser impossível que os que já foram iluminados e provaram o dom celestial, e se fizeram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus e as virtudes do século futuro, e recaíram, sejam outra vez renovados para o arrependimento, pois assim, quanto a eles, “de novo crucificaram o Filho de Deus”. (Hebreus 6:6)

O que os apóstolos querem dizer é que quando conhecemos a Cristo e o rejeitamos depois, acabamos por crucificá-lo novamente, tratando-o como morto para nós. Por isso Cristo se refere a um pecado ainda maior do que a violação da Lei da Hospitalidade, já que além disso, haveria a rejeição do sacrifício de Jesus na cruz.

A segunda passagem se encontra descrita em Mateus 11:23, quando Jesus compara o pecado de Sodoma ao de Cafarnaum. Cristo estava trazendo o mesmo ensino, no sentido de que os sodomitas pecaram por violar a Lei da Hospitalidade, mas Cafarnaum pecou mais, pois além de violar a hospitalidade, expulsando Jesus, ainda rejeitaram a Nova Aliança em Cristo.

Essas duas passagens demonstram de forma evidente que o discurso construído em torno de Sodoma e o pecado mor, transferido para os homossexuais, não apresenta qualquer respaldo bíblico.

Lembrando que a sodomia não possui vínculo com a homossexualidade, conforme Jesus mesmo se refere à violação da Lei da Hospitalidade.

De todo modo, acho importante termos em mente que independente disso, o título de “maiores pecadores” atribuídos aos sodomitas não se sustenta pelas Escrituras.

Cabe ao leitor decidir se irá viver a Verdade aqui apresentada ou a pós-verdade.

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