O desconforto produzido pela relação afetiva entre pessoas LGBTQIAP+ é tema para vários textos. Certamente há produção acadêmica que o explora. Mas este incômodo não fica restrito às pessoas adultas envolvidas. Ele se estende às crianças também.
O que dizem pesquisas
Uma pesquisa foi realizada quando o STF autorizou a união de pessoas homoafetivas. Foi há 11 anos. Segundo ela, 55% da população brasileira era contrária a adoção de crianças por casais homoafetivos. Creio ser legítimo supor que perto de 110 milhões de pessoas preferem crianças nos abrigos que adotadas por pessoas identificadas como LGBTQIAP+.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça, em 2017 havia 47.460 crianças para adoção no Brasil. Mas quase 80% dos casais heteroafetivos estão dispostos a adotar apenas crianças com até 5 anos de idade. E se os casais LGBTQIAP+ estiverem dispostos a adotar em qualquer faixa de idade? Quem for contra, será por qual razão?
Qual o motivo do horror?
Famílias homoparentais existem. Há muito tempo. Se hoje estão mais visíveis, é devido provavelmente a dois fatores. Uma maior visibilidade através da mídia e a atuação de grupos que lutam pela igualdade de direitos.
A maior exposição populariza o debate. Informações incorretas e medo disseminado estão presentes nesta rotina. Por exemplo:
– as famílias LGBTQIAP+ vão acabar com o modelo de famílias hetero e cisnormativas
– as crianças adotadas por pais LGBTQIAP+ são psicologicamente menos saudáveis
– ter pais LGBTQIAP+ faz crianças se tornarem deste grupo
Destruindo as mentiras
Vamos analisar as três questões.
Famílias cis e hetero não deixarão de existir, pois fazem parte da diversidade humana, assim como as diversas famílias LGBTQIAP+. Um casal heteroafetivo somente será destruído por outro homoafetivo é se… um dos seus membros, ou ambos, se perceberem não mais heteros… Mas famílias heteroafetivas e cis se destroem quando expulsam de casa a pessoa gay…lésbica…trans…intersexo…assexual…agênere… Quando facilitam para que suicídios aconteçam…
Não existem crianças criadas por famílias perfeitas. Todas as pessoas que desempenham as funções de pai e mãe são imperfeitas. Logo, nenhum pai ou mãe será perfeito. É admissível supor que crianças criadas por famílias vítimas de preconceitos terão que lidar precocemente com a rejeição. E que esta vivência deixará marcas. Qual o problema : a família homoparental ou o estigma social que lhe é imposto? Estudos mostram que o núcleo central da família é o seu modo de funcionar e a qualidade das interações e relações.
Não é novidade a quem acompanha esta coluna. Ninguém escolhe ser LGBTQIAP+. Não é uma decisão consciente atrair-se por pessoas do mesmo gênero. Nem perceber-se de um gênero que socialmente não está relacionado a uma genitália. Intersexo é biologicamente determinado. A única escolha que existe é mostrar-se ou não ao mundo quem se é verdadeiramente. Ou permanecer disfarçado.
Se a força de grupo, ou dos pais, determinasse gênero ou orientação afetiva, não haveria pessoas LGBTQIAP+. Afinal, estima-se que sejam 20% da população. Se ter pais LGBTQIAP+ transforma crianças em gays, lésbicas, travestis, bissexuais, agênero, pansexuais a força dos 80% impediria a existência deles. Como existem, não é possível que a orientação afetiva ou identidade de gênero dos pais obriguem a das crianças por eles adotadas.
Conclusão
Pertencer a uma família é uma condição que determina saúde. Negar às pessoas LGBTQIAP+ o direito a ter famílias estruturadas é colaborar para o adoecimento. É violação de direitos. É má fé e intolerância.
Privar crianças de lares adotivos disponíveis deveria ser considerado crime contra a humanidade.