Pedro Santos Mundim é doutor em Ciência Política e professor-associado de Ciência Política na Universidade Federal de Goiás. Coordenou por 4 anos o programa de pós-graduação desta área. Em 2009, foi pesquisador visitante no Roger Tayer Stone Center for Latin American Studies da Universidade de Tulane (USA). Entre 2014 e 2015, foi Assessor Especial do Gabinete e Diretor da Assessoria de Opinião Pública da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República do Brasil.
1] a comunidade LGBTQIAP+ é objeto de pesquisa entre os cientistas políticos?
Há vários pesquisadores que trabalham nesta temática. Na Universidade Federal de Goiás estimo existir pelo menos 4 grupos diferentes. E uma rápida busca pela internet deve produzir bons frutos.
2] se os dados da última pesquisa publicada que estimou existirem 4 milhões de pessoas transgêneras no Brasil forem próximos do real quais condições seriam necessárias para que este fato se tornasse um capital político?
Pensando em números, 4 milhões é bastante razoável. Se todos os votos estivessem concentrados em poucas áreas, os candidatos seriam bastante competitivos. Tanto para cargos majoritários (executivo) quanto para proporcionais (legislativo). Como estão difusos pelo Brasil, este poder eleitoral se perde.
O que se observou, nas últimas eleições, foi a eleição de muitas pessoas transgêneras. Em Belo Horizonte, há a vereadora Duda Salabert. O que parece que as tornou eleitoralmente viáveis foi terem aliado as questões trans com outras demandas sociais. A medida que uma pessoa candidata ocupa vários espaços no debate político, ela se fortalece eleitoralmente. Se torna um “ player” competitivo. Mas o jogo político é pesado. As mesmas bandeiras são abraçadas por muitas pessoas candidatas e muitas bandeiras antagônicas aos interesses LGBTQIAP+ são levantadas. São necessárias alianças possíveis dentro do espectro ideológico. Elas fazem parte do jogo a ser jogado.
3] a população transgênera, mais que os demais segmentos LGBTQIAP+, é objeto de proposições moralizantes e anuladoras de sua identidade por vários agentes políticos. Estas proposições são resumidas na expressão “ideologia de gênero”. Este discurso tem poder de retirar votos das pessoas candidatas a cargos políticos? ou as pessoas que votam tendem a ignorar as condições de gênero na hora do voto? Será que pessoas trans somente receberão votos de pessoas trans?
É difícil avaliar o poder desta influência. Por exemplo, pode ser acreditado que as pessoas não votam no gênero feminino. Mas a Presidenta Dilma foi eleita duas vezes. Contudo, há pessoas que se recusam a votar em mulher, ou em trans, ou em qualquer característica em especial. As pessoas transgêneras não receberam votos somente de pessoas trans. Matematicamente isso não é possível. Mas provavelmente receberam muitos dos votos trans. Se eles são insuficientes, a ampliação das propostas políticas é importante para a viabilidade eleitoral.
As pessoas do espectro religioso vão tender a não votar em candidatos trans. São pessoas vistas de forma muito negativas. E quem pensa assim não vão se reconhecer enquanto pessoas preconceituosas.
4] no atual cenário brasileiro, quais seriam os caminhos que este segmento teria que seguir para implantar uma igualdade de direitos civis e à saúde?
É necessário transpor os limites de uma única identidade. Uso uma frase em sala de aula que gosto muito: “eleição não é cruzada cívica, é maximização de votos.” Para conseguir isto, é necessário cativar mais pessoas. Isto significa abraçar também outras bandeiras. E quanto mais alto o cargo, maior o número de pessoas a ser cativado. Ser transgênero é um impulso inicial para a pessoa, mas não o suficiente. Identificar qual espectro ideológico mais próximos, talvez em uma “coalizão de minorias”. Isto possibilita ganho de poder político. E este poder se reflete em possibilidades reais de negociação e implementação de políticas específicas. Não é possível abraçar uma única bandeira. Alinhar todas as solidariedades possíveis.