Janeiro se tornou o Mês Lilás a partir de 29 de janeiro de 2004, em que foi organizado um ato contra a transfobia. O objetivo da campanha é chamar a atenção para a valorização dos direitos das pessoas trans e travestis em todo o Brasil. Além disso, é momento de reflexão para que diversas políticas públicas sejam implementadas, principalmente no que diz respeito às pessoas trans no ambiente de trabalho.
Pesquisa realizada pelo projeto TransVida, do Grupo pela Vidda, com apoio do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, traça cenário bem triste com relação à violência e discriminação que pessoas trans sofrem no emprego. A pesquisa solicitou aos entrevistados que falassem sobre as principais formas de discriminação ou violência que sofreram no trabalho e 27,6% apontaram a própria transfobia; 14,2%, o racismo; e 9%, a homofobia. O desrespeito ao nome social foi relatado por 16,4% desses trabalhadores e trabalhadoras, e 6% já foram impedidos de usar o banheiro correto.
Em casos de violência ou discriminação no trabalho, é recomendado que o empregado busque sua rede de apoio e que reúna colegas, amigos ou profissionais para fornecer orientação psicológica. Ter uma boa estrutura é fator determinante também para enfrentar o momento e conseguir apresentar a denúncia.
O advogado do escritório LBS Advogadas e Advogados Matheus Girelli explica que o indicado é que o trabalhador reúna provas do assédio moral, seja mediante gravações, armazenamento de mensagens em WhatsApp ou e-mails, e anotações de todas as situações vivenciadas, buscando seus colegas de trabalho como testemunhas.
“A empresa precisa estar ciente das situações vivenciadas, e o empregado deve comunicar os atos aos seus superiores hierárquicos, e diante de alguma inércia, formalizar perante o sindicato da categoria e ao Ministério Público do Trabalho (MPT). Além dessas medidas, a depender da gravidade, se pode registrar Boletim de Ocorrência e procurar orientação jurídica, pois o ato pode ter enquadramento criminal e reflexo em demandas judiciais”, explica.
Quatro ações para denunciar o preconceito contra pessoas trans
O advogado Matheus Girelli recomenda pelo meno quatro principais ações que podem ser tomadas no trabalho para denunciar o preconceito:
- Demonstrar apoio à vítima, acreditar na sua palavra e não deixá-la sozinha, reforçando a rede de apoio existente e criando um ambiente seguro.
- Reportar os atos preconceituosos aos seus superiores ou superiores hierárquicos do assediador.
- Reportar os fatos ao sindicato da categoria, bem como ao Ministério Público do Trabalho (MPT).
- Os colegas de trabalho podem ainda auxiliar a vítima na formalização da denúncia ou encaminhamentos jurídicos, disponibilizando-se como testemunhas e auxiliando na coleta de provas, mediante gravações e armazenamento de mensagens ou e-mails.
O preconceito pode ser considerado crime?
O Supremo Tribunal Federal em 2023, ao julgar o Mandado de Injunção nº 4.733, entendeu que os atos de discriminação contra a população LGBTQIA+, especificamente pela orientação sexual ou identidade de gênero, são equiparados ao crime de injúria racial.
A pessoa trans que sofrer discriminação em ambiente de trabalho, seja pela sua orientação sexual ou identidade de gênero, está resguardada pelo entendimento do STF e poderá se dirigir até uma delegacia para lavratura do Boletim de Ocorrência.
“Sabemos que existe o risco da transfobia institucional, mas é importante não se calar e, caso tenha dúvidas nos procedimentos, a vítima deve procurar seu sindicato de classe, assessoria jurídica ou a defensoria pública”, reforça Matheus Girelli.
Quais leis trabalhistas protegem as pessoas trans?
A repressão à discriminação é prevista de forma geral pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que prevê indenização por danos sofridos em ambiente de trabalho, de forma que atos de preconceito ou assédio moral são passíveis de indenização.
A dispensa discriminatória também é vedada no ordenamento jurídico, não podendo ser respaldo para dispensa do trabalho, conforme Decreto nº 10.088/2019, que incorporou ao ordenamento jurídico a Convenção nº 111 da OIT.
O Supremo Tribunal Federal também se manifestou de forma a repreender à discriminação. Em 2019, enquadrou as condutas contra a comunidade LGBTQIA+ como crime de racismo e aquelas direcionadas ao indivíduo, seja pela orientação sexual ou identidade de gênero, como crime de injúria racial.
“Apesar de não possuir legislação específica para a comunidade LGBTQIA+, os entendimentos dos Tribunais ampliam a legislação existente e garantem segurança à comunidade e a responsabilização dos agressores”, completa Girelli.