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Trajetória de uma Mãe de Trans

o que sente uma mãe quando sua filha se apresenta como um filho, e ela não esperava? Como filhos e filhas fazem para contar aos pais o fato de serem transgêneres

Publicado em 25/03/2022

autora: Iara Marques Barbosa Chaves

O ano começava como qualquer outro. Eu fazia contagem regressiva para me aposentar. Já haviam passados 31 anos desde a formatura, com a maioria deles na militância em defesa do SUS. Pensava em desacelerar. Imaginava que agora viria a bonança. Só imaginava…

A filha mais velha já tinha batido asas, construíndo sua própria história.A mais nova terminando o mestrado e também anunciando o vôo para fora do ninho. A caçula sempre foi uma pessoa pouco participativa nos eventos familiares. Adorava se entregar à leitura, escondida em seu recanto, no quarto. Fugia das fotos e dos grandes eventos. Já tinha tido um namoro longo, que havia acabado. Será que era por isso?

Um dia ela criou coragem e nos disse: Sou Bissexual. Para nós, pai e mãe, não foi novidade. Já tínhamos percebido seu interesse por meninas. Nos abraçamos. O importante é ser feliz.

Com o carnaval, que ela não gostava, minha casa sempre vira ponto de apoio para vários amigos. Estamos bem próximos do movimento dos blocos de BH. Foi aí que comecei a perceber um jeito diferente de se vestir na minha filha. Roupas completamente masculinas. Binder. O que é isso? Por quê?

Percebi que tinha mais alguma coisa acontecendo.

Mas parei por aí. Tinha medo de pensar… Fiz de conta que não via. Alguns meses se passaram. Enfim, em julho, veio a defesa da dissertação do mestrado. Eu me sentia a mãe mais orgulhosa do mundo. E empolgada. Mas neste mesmo dia veio a notícia bomba. Ela me entregou um livro pra ler. Era a história de um menino que se sentia preso em um corpo de menina.

A cada página eu repassava a história da nossa vida. A boneca que dei de presente e que nunca saiu da caixa, as roupas da seção feminina que eram um verdadeiro suplicio para escolher, o sofrimento que foi a primeira menstruação…

No final do livro tinha uma carta, descrevendo tudo que vinha sentindo há muitos anos e que terminava mais ou menos assim: ”Mãe, Pai, eu tentei, mas não sou uma menina. Me desculpem por não conseguir falar. Com amor, seu filho Pedro”

Nesta hora me senti caindo num turbilhão. Chorei. Chorei muito! Essa nossa sociedade é cruel demais! O que irão fazer com ele? A gente sente um medo absurdo. É uma mudança muito radical. É como se estivéssemos navegando num barquinho em plena garganta do diabo das Cataratas do Iguaçu. A sensação é de impotência!

Meu Deus! O que eu faço?

Procuramos um amigo psicólogo. Não sei se ele tem noção do bem que me fez quando perguntei: e minha filha? E ele respondeu: está lá, no mesmo lugar, com todos os valores que você ensinou, com todo o caráter que você deu, inclusive com a força e a coragem que você deu, pra tomar esta decisão. Só mudou o invólucro.

Sim!

Eu não precisava perder a filha para receber o filho. A pessoa é a mesma. O espírito é o mesmo. E vai ser mais feliz agora. Foi uma sensação reconfortante.

Aí aparecem outras angústias. Como não percebi antes? Por que não ajudei antes? Eu podia ter diminuído o sofrimento.

Mas a vida vai nos cercando de coisas boas. Uma pessoa muito especial me apresentou a um grupo de mulheres sensacionais. Um coletivo composto por mães e pais de LGBTQIA+. Um espaço para acolhimento e luta pelos direitos dos filhos, filhas e filhes. Com essas Mães encontrei apoio e me descobri fazendo parte de um grupo. A sensação de saber que não lutamos sozinhos é acolhedora, é fortalecedora. Entendi que cada um tem seu tempo e que tudo que podemos fazer é estar lá para apoiar e nos tornar o porto seguro dentro desta sociedade tão agressiva com eles.

Assim, através do respeito à pessoa que ele é, do reconhecimento dos valores que ele tem, da verdade sempre presente e do amor incondicional, nosso barco atravessou o turbilhão e chegou novamente as águas calmas do rio da vida!

E agora o Māes pela Liberdade faz parte da minha caminhada. Estaremos sempre disponíveis para todas as famílias que precisem se encontrar, precisem arrombar a porta do armário, soltar as amarras sociais e encontrar a felicidade.

E tenham certeza, como diz o lema do Mães pela Liberdade de Minas Gerais: “Quando o amor transborda, se transforma em ação”.

Texto retirado, com permissão da autora, do livro Minha mãe sabe

@eduardoribeiromundim

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