(foto: Divulgação/Cley)Bixarte
Bianca Manicongo, mais conhecida como Bixarte, chegou ao seu terceiro disco, Feitiço. Lançado no último dia 20 de novembro, em pleno Dia da Consciência Negra, a cantora, atriz e poeta faz uma mistura de ritmos, mantendo o speed flow e um discurso plural e político que se tornou marca registrada.
Em entrevista exclusiva ao Observatório G, a multiartista destaca que o álbum também promove uma reconexão com sua origem: João Pessoa, a capital da Paraíba, e que celebrou sua chegada com um voto de aplausos na Câmara Municipal. Para ela, o ato institucional traz o reconhecimento do rap paraibano como potência estética e política, após reviver memórias sombrias.
"Eu saí da Paraíba em 2020 após ser ameaçada por um grupo de milicianos, saí foragida por causa de violência, e voltar e receber esse voto de aplauso em João Pessoa significa que a gente está recriando a história. Para mim, me dá mais fôlego para eu continuar essa missão, esse trabalho, e que eu e outras travestis também sejam reconhecidas nessa área", declara Bixarte. Na sua percepção, este projeto pode ser enxergado como um manifesto ancestral e futurista, em que a presença do tambor e da espiritualidade evoca um retorno às origens.
"Esse disco é uma retomada, um álbum que faço questão de voltar o rap e os tambores que foi de onde eu vim. (…) É um disco que eu quero que as pessoas entendam o quão potente é fazer, através do tambor, outros ritmos. O nosso pop paraibano existe e é muito potente também", afirma.

Ao unificar o rap do pop e trazer o speed flow nordestino para as batidas dançantes, Bixarte fez um processo investigativo para entender as MCs que a precederam, e, principalmente, a diferença delas. "Acho que o sotaque, o speed flow que é mais fácil para nós nordestinas, essas características que são do hip-hop e eu levei para o pop. É uma experiência sonora muito grande", diz.
Com participações de Emicida, Johnny Hooker, Lucy Alves, Monna Brutal, Ayô Tupinambá, Vó Mera, A Fúria Negra e Mari Santana, Feitiço é também um disco de alianças. Quando questionada, Bixarte aponta que os critérios foram afetivos, estéticos e políticos. "Eu chamei essas pessoas pela identificação que eu tenho enquanto artista. Admiro essas pessoas, que possuem uma musicalidade e uma identidade própria em um país do TikTok, em que estamos tendo que fazer música de 1 minuto", ressalta.

No disco, a estética do pôr-do-sol, os paredões da periferia e o colorido da cultura da Paraíba é um desmonte ao "Nordeste marrom" representadas historicamente na ficção. "Eu queria fazer desse disco a remeção do pôr-do-sol, que é a coisa mais bonita que tem na Paraíba para mim. Quis essa estética veronil, e não esse Nordeste marrom que a gente vê na novela. Eu queria mostrar a cor que a gente carrega", contextualiza.
A escolha do lançamento, no Dia da Consciência Negra, não foi uma jogada de marketing: é sua data de aniversário, e a necessidade de um conforto musical em meio a uma política social a caminho de retrocessos constantes. "Eu criei esse disco como um presente para mim e para as minhas, como um consolo perante um ano tão difícil. Foram tantos retrocessos relacionados a raça e gênero no mundo, que precisávamos de um acalento", confidencia.

A falta de visibilidade para rappers trans no Brasil ainda é evidente, e Bixarte não romantiza essa narrativa de "ocupação", pelo contrário. "Não conheço um rapper que abriu uma porta para mim, eu acho que a gente foi metendo o pé na porta deles. Foi tudo a custo de muito trabalho. Hoje é que eu sinto que eles nos olham de igual", destaca.
Quando questionada sobre o que diria hoje à Bixarte do álbum Traviarcado (2023), a resposta de Bixarte é um reflexo do seu amadurecimento artístico, e não de arrependimento. "Eu diria para ter mais calma. O Traviarcado foi um disco que eu tive um edital apra cumprir, tive que fazer muita coisa corrida, e o Feitiço eu pude saborear e degustar com calma cada música. A gente fez quase 38 músicas para escolher essas 12. Esse tempo é necessário", pontua.

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