No Rio de Janeiro, uma gari transgênero que se identifica como Victórya foi assunto nesta semana em um suposto caso de preconceito por parte dos colegas de trabalho.
A gari concursada da Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) afirma que foi impedida de usar o banheiro feminino da empresa e que teve sua folha de ponta falsificada para forjar supostas faltas.
Victórya explicou ao jornal O Globo que a medida que seu corpo foi passando por mudanças por causa da transformação de gênero, ela se sentiu mais confortável em passar a usar o banheiro feminino mas, a gerência da empresa não entendeu sua situação. A gari afirma ter sofrido represálias de funcionárias mulheres, e por isso, voltou a usar o banheiro masculino.
“Foi onde comecei a ter problemas com o gerente. Ele dizia que eu era homem e que eu tinha que usar banheiro de homem. Fui à delegacia e prestei queixa. Procurei a Defensoria Pública, que perguntou se eu queria entrar com uma ação judicial pedindo danos morais, mas eu respondi que não, porque eu queria continuar trabalhando na empresa. Eu queria mesmo só um acordo com eles. Em seguida, chegou um ofício da Defensoria falando dos meus direitos” — explicou Victórya, que acabou sendo transferida.
Nos últimos tempos, a gari transgênero afirma que já teve que trocar por pelo menos cinco vezes de local de trabalho: Flamengo, Botafogo, Marechal Hermes, Campo Grande e Mendanha.
“Antes de me transferir, o gerente do Flamengo passava por mim e ria, fazia piada. Outros garis também faziam chacota. Fizeram várias coisas para manchar a minha imagem, fui humilhada, faziam de tudo para me rebaixar. O gerente de Botafogo, por exemplo, me chamou para conversar e disse que eu estava de frescura porque existiam outros travestis na Comlurb que usavam o banheiro masculino, o que era mentira. Só eu de trans consegui ficar na companhia. Até que um dia discuti com um gari, que me disse várias palavras chulas e tentou me desmoralizar. Aquilo foi o estopim, porque fui à gerência e eles tentaram me colocar como a agressora. Depois disso, comecei a ficar doente. Eu só chorava, não saía da cama. Me sentia um nada. Foi o pior de tudo que já passei”, relatou Victórya, que afirmou que tentou suicídio duas vezes e iniciou tratamento contra a depressão.
Em junho, Victorya conta que a situação ficou ainda mais difícil: sua folha de ponto no trabalho foi adulterada para forjar faltas, o que lhe causou uma suspensão e a perda de cerca de R$ 400 do salário.
“Eu estava na gerência de Marechal Hermes, e meu cartão foi rasurado assim que eu voltei do médico do trabalho, no início do mês. Entrei em tratamento devido ao estágio da minha doença (depressão), e o médico do trabalho, pelo laudo da minha psicóloga e da minha psiquiatra, me afastou das ruas. Eu tinha que trabalhar internamente, pois não podia ficar em áreas movimentadas. Quando entreguei o laudo do médico do trabalho, simplesmente meu cartão voltou rasurado e com quatro faltas, que eu não tive. Numa delas tomei até uma suspensão, e até hoje eu não sei por que fizeram isso” afirma Victorya.
Após a gari procurar a ajuda do vereador David Miranda, primeiro gay assumido da Câmara do Rio, a advogada do gabinete do político, Samara Castro, passou a tomar conta do caso de Victorya.
“A primeira coisa a ser feita é tentar reverter os descontos no salário dela e as faltas que ela afirma que colocaram no ponto. A segunda etapa será entrar com uma sindicância para apurar a postura da chefia, que não respeitou o nome social e não permitiu que ela usasse o banheiro feminino, o que a constrangeu e a humilhou, além de colocá-la em situação de risco” — afirmou Samara Castro, a advogada do gabinete de David Miranda, explicando que vai tentar uma recomendação para que a empresa passe a tratar todos os funcionários com dignidade e respeito.
“A gente está prestando atendimento jurídico. Vamos entrar com um requerimento contra a Comlurb. Também vamos marcar uma reunião com representantes da companhia para que eles promovam treinamentos e melhorem a assistência aos funcionários” — afirmou o vereador David Miranda.
Procurada, a Comlurb informou em nota que “de forma geral nessas situações, sempre respeita a individualidade dos funcionários, inclusive a forma como querem ser tratados”.