Diversidade

“Ariel – A travessia de Um Príncipe Trans e Quilombola”; Veja Entrevista

O jovem escritor Jared Amarante é o autor desta obra de inclusão

Jovem escritor Jared Amarante
Jovem escritor Jared Amarante (Foto: Divulgação)

O jovem escritor Jared Amarante, 29 anos, está à frente de uma obra voltada ao protagonismo de corpos trans, gordos e pretos. O seu livro “Ariel – A travessia de Um Príncipe Trans e Quilombola” tem como verdadeiro propósito relatar a importância da transexualidade a um personagem principal de uma história. O autor busca demonstrar em sua escrita um acolhimento a aqueles que mais sofrem em um país transfóbico.

A carreira do Jared não começou recentemente, ele já tinha cinco livros publicados ao embarcar nessa nova aventura em uma obra LGBTQIA+. A trama abordada em Ariel é direcionada para o público infantil e adulto, dentro das ilustrações ao decorrer do livro é possível vivenciar uma trajetória semelhante ao que enfrentamos em um país que tem como principal fundamento a estereotipagem de gênero, preconceito limitante e falta de inclusão de alguns grupos sociais.

Leia a seguir entrevista com o jovem escritor:

Quem é o Jared Amarante?

Se definir é, para mim, uma das coisas mais complexas da vida. Porque essa mesma vida nos impõe tantas situações que não conseguimos ser o mesmo para sempre, e que bom! Isso tem, claro, lados muito positivos e negativos. Então eu sou um jornalista, escritor, roteirista e, acima de tudo, humano. Gosto da última palavra, que me define melhor. Porque estamos em constante construção, por isso acredito que uma vivência, situação, sentimento, trauma, dor, relação, trabalho, não nos resume. Estamos além… 

O que te motivou a abordar o tema transexualidade em um livro?

Esse é meu sexto livro e eu já estava sentindo a necessidade de produzir algo com um protagonista trans. Porque é esse lugar, de protagonismo, realeza, destaque, que são negados aos corpos trans e travestis. Além disso, sempre foi um sonho construir um príncipe trans, porque acredito que essas coletividades são as pessoas mais fortes, corajosas, poderosas, do mundo, porque são capazes, em muitas situações, de atravessarem o fogo do preconceito e saírem vivas do outro lado. Eu quis homenageá-las, fomentar o diálogo, proporcionar representatividade. Essa obra, também, é parte da minha contribuição na luta antirracista, antitransfóbica, antigordofóbica. 

A ideia de o personagem principal ser trans e quilombola, surgiu de quais referências?

Quando a palavra ‘Quilombola’ me vem à mente, ao mesmo tempo penso em força, luta, resistência, vida. É sobre resistir que corpos trans, pretos e gordos e quilombolas mais entendem nessa vida, infelizmente. Porque a existência não deveria ser sobre ter que resistir 24 horas por dia. Pensando nessa garra, de um povo que fugia das fazendas e formava quilombos, eu quis trazer o ‘Quilombocéu’, que é um lugar de aceitação, de igualdade. Minha maior referência é a própria história, que foi e é cruel, mas que se não fossem os quilombos, talvez não conheceríamos a potência do povo preto. Viva a pretitude!

Quais são suas inspirações para a composição da obra?

Foram mais de quatros anos produzindo essa obra. Então as inspirações são muitas, mas posso dizer que a mais sublime delas foram os diálogos que tive durante todo esse período. Conversei e entrevistei corpos trans, pretos e gordos, tentando compreender, ainda que minimamente, suas dores, angústias, sonhos e, principalmente, travessias. Estar nesse laboratório real, fez com que eu compusesse um dos personagens mais inesquecíveis, memoráveis e necessários da minha carreira. Viva o Ariel de cada lugar!

Qual seu principal objetivo com uma obra LGBTQIA+?

As expressões artísticas têm tido muitos avanços quando o assunto é representatividade, abertura de diálogos, fomento de autoestima da população LGBTQIA+. Mas ainda falta muita coisa. E quando digo muita, realmente é em uma escalada grandiosa, ou seja, gays são sempre estereotipados, corpos gordos estão sempre num lugar cômico, pretos como objeto sexual, trans e travestis como revoltadas, agressivas ou alvo fetichista. Portanto, chega! É hora de nos sentirmos melhor representados, acolhidos e, mais do que tudo, respeitados. Diante deste cenário, meu objetivo (se fosse apenas dizer o principal) é trazer aos corpos trans, pretos e gordos, o sentimento de que são belos, competentes e especiais nesse mundo.

As ilustrações no livro têm qual intuito?

Além de um mergulho na ludicidade, as ilustrações têm como propósito engajar mais a história, torná-la mais visual, permitir com que crianças se interessem mais, porque sabemos que desenhos chamam atenção desse público. Além disso, as ilustrações de Nathan H. Borges são o verdadeiro sopro da vida. As mãos talentosas de Nathan é que deram vida a Ariel, as suas sensações. Os desenhos, também, trazem muito ineditismo e geram curiosidade, porque ao observá-los, será preciso compreender a história ou pesquisar a história, pois fará com que o leitor faça um mergulho mais profundo, belo e consciente.

O que busca retratar com um personagem principal gordo?

Corpos gordos, diante do olhar social, são vistos como preguiçosos, sedentários, doentes, feios, incapazes. E trazer um protagonista gordo, que é coroado como príncipe, significa muito. É importante que não tenhamos um olhar julgador para com esses corpos, porque magreza não é sinônimo de saúde, e ser gordo não é tradução de doença. Vamos limpar nossos olhos antes de falarmos do corpo de alguém, até mesmo porque corpos gordos não querem nossa validação ou opinião. Só querem e devem ser respeitados.

Qual foi a parte mais dificil de escrever no livro?

Não vejo uma parte ‘mais difícil’, porém vejo muitas que me emocionaram demais, então posso dizer que foram ‘partes desafiadoras’. O momento em que Ariel é corado, que faz uma ligação com o nascimento de Jesus, me senti desafiado e refleti muito sobre como iria compor isso. Mas entendi que o coroamento de Ariel é como as travessias e transições dos corpos trans: um renascimento em si. É lindo! Potente! Doloroso!

Para quem é voltado a obra?

Para todos os corpos. Aos cis, magros e brancos, que possam evoluir suas mentes, se engajarem na luta, para que não reproduzam transfobia, gordofobia e racismo. Aos corpos pretos, trans e gordos, espero que se sintam abraçados, representados, acolhidos. Que se sintam mais pertencentes ao mundo.

O que você gostaria de dizer ao público do Observatório G?

Que gravemos a frase do psicólogo Rossandro Klinjey. ‘Eu não preciso do seu amor, mas eu não abro mão do seu respeito’. Essa frase, inclusive, está na orelha do livro. Obrigado por essa entrevista! Que Ariel chegue muito longe!

Eu sou o Maurício de Britto, colunista de políticas públicas na coluna Politizah (Clique aqui)!

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