Primeiro prefeito gay do Brasil, Edgar Souza comenta projetos profissionais e relacionamento com modelo

Prefeito Edgard Souza e namorado
Prefeito Edgard Souza e esposo Max Souza (Foto: Acervo Pessoal)

Por André Júnior

Edgar Souza, o primeiro prefeito assumidamente homossexual do Brasil, foi eleito em 2012 pela cidade de Lins e conquistou a reeleição no ano de 2016 pelo PSDB. O prefeito do interior de São Paulo ganhou destaque nesta semana graças ao seu novo namorado, Max (26), que está prestes a participar do maior concurso do país, o Mister Brazil. A redação do Observatório G procurou Edgar para tratar não só do assunto do momento, mas também para debater sobre o preconceito sofrido pela comunidade LGBT, políticas sociais e muito mais. Confira:

Edgar, com quantos anos você ingressou na política e o que lhe motivou?

Gosto de política , no sentido mais amplo do termo , desde muito cedo. Sempre fui presidente de sala e fundei o Grêmio estudantil da escola que estudava quando adolescente. Depois, por ser de uma família católica bem militante, sempre tive uma participação nos grupos de jovens e pastorais. Minha paróquia era bem progressista. Muito na minha da teologia da libertação. Isso fez eu ter uma compreensão de fé como chamado para mudar o mundo, tornando um lugar melhor para todos. Isso me estimulou a ser candidato a vereador quando ainda tinha 21 anos. Deu certo. De lá para cá não parei, mas sempre tendo essa compreensão que a política é um ministério. Uma missão ligado ao propósito de tornar o mundo melhor. Pra mim estar num cargo público é estar a serviço desta causa. Da causa de um mundo fraterno, justo e solidário. Enquanto ser humano e principalmente enquanto pessoa que teve esse encontro com os valores de Cristo ( isso não tem nada com religião, mas com fé , princípios) não posso me calar frente as injustiças ou frente a qualquer coisa que fira a dignidade humana , como o racismo, o machismo , a homotransfobia e outras situações de morte de nossa sociedade; 

Em 2016 você se tornou o primeiro prefeito socialmente assumido homossexual no Brasil. Em sua opinião, como sociólogo, o que torna tão difícil a aceitação de um jovem gay e posteriormente na fase adulta?

Na verdade foi em 2012. Já estou no segundo mandato. Em 2016 passamos a ter mais um prefeito LGBT. Óbvio que é um desafio histórico. Mas fico feliz por ver o reconhecimento de minha comunidade. Embora todos os ataques homofóbicos puder mostrar que nós LGBTs temos capacidade e compromisso. O preconceito principalmente o construído pelos grupos fundamentalistas e da extrema-direita sempre nos “pintam” como depravados, pedófilos e que só pensam em sexo. Minha comunidade poder ver que isso não é verdade e no exercício do mandato fui o prefeito que resolveu os problemas crônicos da saúde e educação da cidade. O que mais obras de infraestrutura fez e o que mais estimulou ações de geração de emprego , sem descuidar dos grupos mais vulneráveis. Isso fez com que mesmo na maior crise da história do país que levou a uma renovação de mais de 90% dos prefeitos da região eu fosse um dos raríssimos que foi reeleito. Defendo nossas causas enquanto causas humanas, mas cuido de todas as áreas. Temos capacidade como qualquer pessoa. Ser um prefeito LGBT ajuda a criar referência positiva para nós e para toda sociedade.  Essa questão da “aceitação” está ligada à toda nossa cultura e a falta de conhecimento. Muitas vezes falta conhecimento até para nós LGBTs. Vivemos processos históricos e na história, com nossas ações vamos mostrando e afirmando nossa existência. Hoje quando assistimos qualquer filme que fala sobre a situação das mulheres e dos negros no passado podemos ver que no fundo são argumentos muito parecidos que usam contra nós hoje. A origem é a mesma. Uma sociedade machista, patriarcal, branca e elitista. Mas com nossas ações temos mudado a história. Estamos longe de estar bem, assim como para as mulheres e para os não brancos. Mas ao olhar a história não tenho como negar que tivemos avanços. Mas óbvio que precisamos ficar vigilantes e na luta para preservar o que conquistamos até aqui e buscar mais. Queremos apenas ter nossa existência garantida. Mas isso não será um presente e sim uma conquista.

Profissionalmente, qual são os seu projetos e principais objetivos?

Bom, sou educador. Desde jovem trabalho com formação e tenho feito isso concomitantemente ao exercício do mandato. Sou coach e estou trabalhando para ajudar mais pessoas com essa ferramenta . Na política o projeto é a eleição de deputado para defender nossas bandeiras , mas não só elas. Não podemos ser monotemáticos. Temos total competência para discutir todos os problemas da sociedade como reforma do estado, reforma tributária, reforma política, implantação de políticas públicas que efetivamente diminuam a desigualdade social e melhorem a vida das pessoas, em especial nas áreas da educação, saúde, assistência social, esporte e cultura. Quero levar para o parlamento minha militância humanista em defesa da democracia real que não permite segregação, portanto , não permite racismo, misoginia, intolerância religiosa, homotransfobia e outras violências, mas quero levar junto minha experiência de gestor público municipalista, defensor do fortalecimento do poder local como forma de dar maior poder as comunidade. Vou defender o empreendedorismo, a sustentabilidade entre outras causas. Quero também, em meus objetivos, terminar bem meu mandato. Estamos construindo a duras penas um novo momento em nossa cidade. Conseguimos atrair para cá um dos maiores investimentos privados do país. Aqui a General Eletric e parceiros construirão uma das maiores termoelétricas a gás do mundo. Um marco em nossa história que irá impulsionar ainda mais a geração de emprego e o desenvolvimento tecnológico da cidade e região.

Você pensa em tornar-se um servidor público federal, por exemplo, como um deputado federal. Se sim, o que te guia nessa vida política?

Quero sim. Hoje estamos avaliando se vou disputar uma vaga para a assembleia legislativa ou já para a câmara federal. Mas é o caminho a ser trilhado. Como disse, quero levar minha militância humanista minha experiência de gestor púbico inovador para o parlamento e mostrar que temos ideias e projetos para deixar nosso país pelo menos menos desigual e violento. É a política que transforma a sociedade. Estou falando de política e não politicagem. Acho um erro essa demonização da política. E agora estamos vendo que esse discurso todo não trouxe nada novo de verdade. Pelo contrário. Por isso temos que fazer a boa política. A política baseada no diálogo, da busca de consensos quando possíveis e da disputa civilizada. O país precisa construir uma agenda mínima que una a todos ou pelo menos a maior parte da sociedade de forma equilibrada. Vamos fazer quase 20 anos de uma política de confronto, de uns contra outros. Não vejo bons frutos nisso. As disputas são inerentes e saudáveis. Mas tem que ter civilidade e uma pauta mínima da nação. Esse jogo de poder pelo poder tem que ser superado, pois nele só os grandes ganham e o povo é massacrado. Quando olhamos as discussões políticas atuais parece que estamos num cenário bizarro e temos tantos temas urgentes. Só a sociedade organizada muda isso. Isso me motiva. 

Qual é a sua missão como cidadão e como um homem gay na sociedade?

Estou aqui para ajudar o mundo a ser melhor. Mais justo, mais humano, mais belo. Tenho comigo que ou o mundo é bom para todos ou não será bom para ninguém. Assim como tenho comigo também que quando você aceita um preconceito você está avalizando todos os outros. Enquanto gay luto e continuarei lutando pelo nosso direito sagrado de existir e não sermos segregados. Mas tenho convicção que isso se dá olhando e combatendo todas as formas de preconceito e injustiças. Acredito na nossa capacidade humana de sermos melhores , luto e lutarei sempre por isso!


Você recentemente externou o seu relacionamento como o modelo Max, você pensa em se casar mais uma vez? Hoje o casamento homoafetivo é permitido em qual esfera – cível apenas?

Max e eu estamos juntos faz 7 meses e temos vivido uma história linda. Já moramos juntos. Tive uma linda história no passado e sou muito grato por ela e por meu ex marido Alex, que hoje é meu amigo mais que querido. Mas agora estou num novo momento e pretendemos oficializar sim. Ainda não sei quando, mas vai acontecer . Mas o mais importante é que já estamos juntos e nos amamos muito. O casamento homoafetivo nos foi garantido pela justiça. Ainda nao temos uma lei sobre o assunto , o que é uma pena . Mas o STF reconheceu as relações estáveis homoafetivas e na sequência o CNJ determinou sua conversão em casamento aos casais que assim quisessem, bem como a garantia de casamento aos que desejassem. Foi uma vitória importante para a sociedade contra a segregação.


Quanto a criminalização da homofobia pelo STF, quais são as suas expectativas neste julgamento?

Estou confiante. Consegui que a Frente Nacional de Prefeitos, da qual sou membro da diretoria, se manifesta-se favorável a criminalização junto ao STF e fui recebido em nome da Frente pelo ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo e pelo ministro Barroso. Senti confiança que o suprema irá garantir que as situações de racismo que sofremos serão  devidamente punidas.

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