Reparação

Justiça condena Lojas Americanas por discriminação em Salvador: “Preconceito não passará impune”

Justiça condena Lojas Americanas por discriminação em Salvador: “Preconceito não passará impune”

Um caso emblemático de discriminação racial, homofóbica e capacitista ganhou desfecho na Justiça e trouxe alívio — e representatividade — para muitas vozes historicamente silenciadas. A Lojas Americanas do Shopping Center Lapa, no coração de Salvador, foi condenada a pagar R$ 20 mil por danos morais a um cliente que relatou ter sido alvo de abordagens violentas e discriminatórias dentro da loja.

O episódio aconteceu em outubro de 2023. O cliente — que preferiu não se identificar por temer retaliações e reviver o trauma — relatou que foi seguido por seguranças, abordado com truculência, chamado de “palhaço”, impedido de acessar informações públicas e agredido verbal e fisicamente. “Eles não me viam como um consumidor. Me enxergaram como uma ameaça apenas por existir ali”, teria dito, em depoimento colhido durante o processo.

Vídeos gravados pela própria vítima e apresentados à Justiça comprovaram a abordagem violenta e discriminatória. As imagens foram fundamentais para a decisão da juíza Graça Marina Vieira da Silva, da 19ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais do Consumidor, que reconheceu o tratamento abusivo e ofensivo por parte dos funcionários da loja.

Além de responsabilizar a Americanas, a sentença também apontou omissão da administração do Shopping Center Lapa, que foi citada no processo, mas não compareceu à audiência — sendo julgada à revelia. A Justiça determinou ainda que o Ministério Público da Bahia (MP-BA) e a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (SJDHS) sejam notificados para investigação dos fatos e possíveis desdobramentos.

Guilherme Cabral, estagiário do escritório Abreu & Bittencourt, atuou no processo que resultou na condenação por homofobia.

Para o advogado Ives Bittencourt, que representou a vítima ao lado do estagiário Guilherme Cabral, do escritório Abreu & Bittencourt, a decisão vai além da reparação individual: “Essa condenação é uma sinalização de que a Justiça brasileira está vigilante e não tolera violências motivadas por racismo, capacitismo ou LGBTQIAPN+fobia. Vai além do caso concreto. Ecoa por todas as vozes ignoradas, intimidadas, silenciadas. O preconceito não passará impune. Denunciar é um ato de coragem — mas, mais que isso, é agora um caminho legítimo de justiça, reparação e dignidade.”

Em nota, a assessoria do Shopping Center Lapa afirmou que o empreendimento “não possui qualquer envolvimento ou relação com os fatos mencionados no processo”, e reiterou “o compromisso com a diversidade, inclusão e dignidade de todas as pessoas, repudiando veementemente qualquer forma de discriminação”.

A Lojas Americanas apresentou defesa ao longo do processo, mas os argumentos foram rejeitados pela magistrada.

Um alerta que se torna coletivo

O caso, ainda que tenha sido protagonizado por uma única pessoa, toca em feridas sociais profundas: o racismo estrutural, a LGBTQIAPN+fobia cotidiana e a invisibilidade das pessoas com deficiência. Em Salvador, cidade de maioria negra e rica diversidade, o episódio se torna ainda mais simbólico — e urgente.

A condenação carrega não apenas o peso de uma reparação financeira, mas o valor simbólico de uma vitória coletiva. “Essa dor não é só minha. É de muitos. O que me fizeram foi tentar me apagar, me fazer crer que meu corpo, minha identidade, não tinham valor. Mas agora, a Justiça disse o contrário”, relatou a vítima em uma manifestação enviada ao advogado após o julgamento.

O processo foi conduzido pelo estagiário Guilherme Cabral sob a supervisão da equipe de Direito Antidiscriminatório do escritório Abreu & Bittencourt.

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