Por André Júnior
Mônica Benício tornou-se nacionalmente conhecida após o brutal assassinato de sua esposa, Marielle Franco, no dia 14 de Março de 2018. Mônica continua à erguer as bandeiras da vereadora eleita pelo Rio de Janeiro, e cobra diariamente o desfecho final das investigações.
Há dois dias de completar 1 ano, o “Caso Marielle” permanece repleto de incógnitas. Entretanto, na manhã desta terça-feira (12), a Polícia Civil do Rio e o Ministério Público do Estado anunciaram a prisão de dois suspeitos. O que acendeu a chama da esperança mais uma vez no peito dos familiares e do estado democrático de direito.
Logo após o anúncio, Mônica, a esposa de Marielle, manifestou-se e explicitou o fato de ainda restar peças para completar o quebra cabeça. Confira o tweet de Mônica:
Em entrevista exclusiva ao Observatório G, a arquiteta fala sobre a resiliência de manter as lutas de sua companheira. Além disso, ela expõe quais são os seus planos pessoais para os anos a seguir, sem a presença de sua amada.
Como você recebeu primeiramente a informação de que a “Estação Primeira de Mangueira”, iria homenagear Marielle? E posteriormente a notícia de que a escola se consagrou como a campeã do carnaval?
O enredo da Mangueira fala sobre representatividade, referência. Quando soube do samba que fazia uma homenagem a Marielle, além de outras personagens marcantes da nossa história, foi logo na sua criação. Achei lindo. Ficava muito emocionada a cada etapa que o samba avançava. A vitória do samba foi na madrugada do dia 14 de outubro quando também foi o ato da distribuição das placas com o nome de Marielle na cinelândia. Ali eu já tinha entendido esse samba como homenagem a ela, mesmo que não houve essa relação propósital.
Eu assisti a apuração na quadra da escola. A energia era tão linda que não dava pra conter a emoção. A vitória da mangueira pra mim significa parte da justiça por Marielle. Ajuda a resignificar a noite do 14 de março não admitindo apenas como noite de violência e barbárie, mas compreendendo q marielle virou um símbolo de resistência e esperança. Eu dei a blusa com os dizeres “Lute como Marielle Franco” pra Cacá Nascimento, uma das puxadoras do samba. Ela vestiu pouco antea de cantar na quadra pra celebrar a vitória. Ver a Cacá, que é menina negra de origem da favela da mangueira, me fez, pela primeira vez em 12 meses, chorar de alegria. Ali eu vi que minha luta tinha sentido. Ali eu vi o legado de Marielle.
Marielle torna-se paulatinamente uma entidade mais forte e consagrada socialmente e politicamente no Brasil, mas, nós ainda não sabemos quem matou e quem mandou matar a vereadora. Homenagens são lindas, mas no final do dia qual é o seu maior desejo como mulher, esposa e cidadã brasileira a respeito desse assassinato?
São sentimentos distintos. Como cidadã minha indignação é profunda por esse descaso. 1 ano não é um tempo admissível para uma investigação de um assassinato com repercussão internacional. Marielle era uma defensora de direitos humanos, uma parlamentar em exercício. O Brasil passa vergonha internacional por não apresentar uma resposta. Um crime que foi um atentado a democracia e uma grave violação de diretos humanos não pode ficar impune. O Estado Brasileiro tem que responder quem mandou matar Marielle.
No campo pessoal, como esposa a minha dor é imensurável. Não há uma noite ou uma manhã sem choro ao perceber a realidade da ausência dela. As homenagens são importantes sim para preservação da memória dela, a solidariedade e carinho que venho recebendo de diversas formas são hoje o que me ajudam a seguir.
A sociedade num contexto geral, lhe procura para ajudar – monetariamente ou para compor resistência – da mesma forma que lhe consultam para poder usar o nome de Marielle em movimentos, campanhas e afins?
Monetariamente não. Para compor resistência somando a movimentos socias sim. E não sou tão consultada, quanto acho que deveria, para o uso da imagem de minha companheira. Inclusive muitas vezes considero o uso indiscriminado. É preciso saber diferenciar homenagens e exploração, apropriação ou aproveitamento de quem quer que seja.
Você notou alguma diferença positiva e ou negativa nas investigações do “Caso Marielle” após a mudança de governos? A transição Temer para PSL mudou algo para vocês da família de Marielle?
Não houve mudança. Houve de minha parte um aumento de preocupação uma vez que o presidente nunca se pronunciou sobre o caso mesmo sendo questionado inúmeras vezes. O crime político de maior repercussão na história do país que completa 1 ano sem solução não ter o pronunciamento do presidente a seu respeito para mim simboliza descaso. Marielle era uma parlamentar em exercício, sua execução foi um ataque a nossa democracia, o presidente deveria ter se pronunciar a respeito afirmando o comprometimento do estado brasileiro com a elucidação do caso.
Quais valores de Marielle continuam vivos dentro de você, sua casa e na família Franco? O que você pretende fazer para que o legado dela seja eterno? Existem planos de investir na política ou algo parecido?
Marielle e eu construímos uma família juntas, mas antes disso já eramos companheiras de luta e sonhos. Nosso desejo de viver numa sociedade mais justa e igualitária era o que nos tornava defensoras de direitos humanos. Há muitas maneiras de fazer política. Afirmar a existência do nosso amor e da nossa família por exemplo é uma dessas formas. Hoje eu não considero a política institucional como um caminho, mas se em algum momento eu achar que posso contribuir positivamente e com responsabilidade ocupando esse espaço eu não hesitarei em fazer. Mas por enquanto eu sou uma defensora de direitos humanos, ativista LGBTI+ e minha prioridade é justiça por Marielle, é saber quem mandou matar minha mulher.
Quem já foi Mônica Benicio, quem é hoje e o que você almeja ser nos próximos anos?
Sou uma mulher lésbica, favelada, arquiteta urbanista. Sempre lutei na minha vida, por direitos, por respeito. Durante muito tempo lutei para ser respeitada enquanto uma mulher favelada, que amava outra mulher favelada, e que queria construir uma vida com ela. Isso já me foi tirado. Agora eu sou uma ativista, que luta para que todas as faveladas e favelados, todos os marginalizados, todos os LGBT, todos possam viver em plenitude, com respeito. E luto por justiça por Marielle. Sempre. Nos próximos anos eu não sei. Não sei o que esperar de um país que cala e consente na morte de uma vereadora e liderança social como a Marielle. Só sei que enquanto estiver viva continuarei lutando.